Tempero brasileiro em solo japonês

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Com uma trajetória de desafios e sucesso, casal de nikkeis é um dos pioneiros no empreendedorismo no Japão

Texto e fotos: Cibele Hasegawa

De Aichi, Japão

 

Diariamente, Joana Hatadani e Roberto Inoue acordam cedo para trazer os sabores brasileiros à terra do sol nascente, mais precisamente na cidade de Toyota, província de Aichi. Tortas, salgados, pastéis e churros são algumas das delícias que compõem o cardápio da “Lanchonete da Tia Jô”. Isso sem falar nos lanches, feitos exatamente como conhecemos no Brasil, e o típico “PF” (prato feito) – que são os carros-chefe da casa.

E para acompanhar esse banquete de brasilidade em pleno Japão, você ainda pode pedir sucos naturais ou um guaraná, além daquele belo cafezinho para finalizar essa viagem ao Brasil através do paladar. E o casal afirma: “é tudo feito com muito amor e carinho”, dois ingredientes essenciais para deixar o tempero da Tia Jô com aquele gostinho de “lar”. Afinal, quem já morou fora do país sabe a falta que faz o “arroz com feijão” rotineiro.

E foi justamente essa saudade que motivou a trajetória empreendedora do casal. Quando eles chegaram no arquipélago, em abril de 1989, “os brasileiros eram uma novidade para os japoneses”, conta Inoue, ou “Tio” – como é conhecido. Também “não havia lojas, produtos ou restaurantes brasileiros como hoje”, lembra. Era o início do movimento dekassegui, afinal.

Para matar a vontade de voltar a provar os sabores do Brasil, surgiu a ideia de trazer os ingredientes de lá para cá e preparar as deliciosas receitas que bem conhecemos. Foi assim que, há mais de 20 anos, eles inauguraram seu primeiro restaurante, com lanches, pratos, marmitex e toda a brasilidade que faltava. Posteriormente, os nikkeis empreenderam em mais um novo negócio: a mercearia móvel, com caminhões que rodavam pelas cidades vendendo diversos produtos brasileiros.

Mas essa empreitada não foi fácil. “Era um desafio! Não haviam brasileiros abrindo um negócio próprio”, recorda Tio. Além do capital de investimento, era preciso entender as leis locais e aperfeiçoar a fluência na língua japonesa. “Hoje há muitos atacadistas brasileiros e outras empresas no ramo que facilitam bastante o comércio. Mas naquela época a negociação era só com japonês”, ressalta.

Isso sem falar em outros obstáculos e aprendizados que surgiram ao longo dessa trajetória de 30 anos em solo japonês. O Tio conta que já trabalhou em chão de fábrica, reergueu uma empresa à beira da falência, desfez uma sociedade, fechou empresas, abriu novos negócios, gerenciou uma churrascaria e até tomou um calote de um antigo sócio. Foram inúmeras experiências vividas e barreiras superadas, sempre com muito esforço e dedicação ao longo da jornada.

Mas apesar das dificuldades, Inoue afirma que, ainda assim, empreender no Japão é mais fácil por conta da estabilidade econômica do país. “Não é preciso estocar produtos com medo de estar mais caro na próxima compra. Aqui não tem inflação”, explica o nikkei que era comerciante quando morava no Brasil.