What´s up? Administradores

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A evolução tecnológica e o surgimento de mídias sociais alavancaram formas de comunicação mais complexas como a interação em grupos de whatsapp[1]. Nesses grupos, todos os integrantes possuem acesso as mensagens trocadas e muitas vezes mais de um assunto é tratado de forma concomitante, dificultando o entendimento até mesmo dos usuários mais atentos.

O ambiente virtual pode propiciar aos usuários menos experientes uma falsa sensação de anonimato ou uma falsa ideia de irresponsabilidade de suas ações. Nesse contexto, problemas dos mais variados podem ocorrer, seja uma simples falha de interpretação em razão dos diferentes contextos dos integrantes até a prática de uma ofensa, compartilhamento de conteúdo inapropriado ou exclusão de integrantes indesejados.

A figura do administrador do grupo, com a função de moderar as interações, ganha especial relevância na medida em que detém a prerrogativa de avaliar se os comportamentos estão adequados ou inadequados para finalidade do grupo. Pode, inclusive, remover mensagens e nos casos mais graves, excluir o próprio integrante. No entanto, como se pode imaginar, não é tarefa fácil de se exercer sobretudo porque inexistem políticas claras e objetivas do que se considera um desvio de comportamento. A matriz jurídica geral determina que uma pessoa responde pelos seus atos[2][3][4] e somente em casos excepcionais responde por ato de terceiros[5], como os pais em nome dos filhos, o empregador pelo empregado (no exercício da função) ou o dono do animal.

Qual seria a responsabilidade do administrador na hipótese de um integrante causar dano ao outro?

No Brasil, o leading case foi julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em 2016. Um grupo de whatsapp foi criado durante a Copa de 2014, com a finalidade de marcar encontros para os jogos, contudo, o grupo acabou servindo para prática de ofensas contra 3 integrantes, sem que o administrador tivesse tomado providências no sentido de coibir, alertar ou cessar os atos. A ação foi dirigida contra o administrador do grupo e em primeira instância foi afastada a responsabilidade. Entretanto, em segunda instância, o desembargador afirmou que embora o administrador não tenha ofendido diretamente os integrantes e também não era capaz de prever que os integrantes diriam, o criador do grupo é denominado administrador por uma razão: pode adicionar ou remover textos, integrantes e até mesmo encerrar o grupo. Após ser questionado diretamente sobre as ofensas agiu com ironia. Desse modo o Desembargador reconheceu a responsabilidade do administrador por omissão geradora de dano[6].

A decisão é criticada por estudiosos porque não enfrentou o tema de forma aprofundada. Contudo, a meu ver, se o administrador permanecer omisso diante ofensas reiteradas contra outro integrante estará sujeito a responsabilização. Ou seja, para que haja responsabilização do administrador sua postura deve ser condescendente ao ilícito praticado por um integrante, quase como um participe da ação. Trazendo uma outra situação hipotética, imagine que um dos integrantes realiza venda de produtos no grupo, mas reiteradamente não os entrega. O fato é alertado ao administrador, mas este não adota nenhuma providência, deixando que outros integrantes sejam lesados. Particularmente vislumbro responsabilização do administrador por omissão.

No campo criminal, se o grupo estiver envolvido em situações como tráfico de entorpecentes, pedofilia etc não resta dúvida quanto a responsabilidade do administrador e dos integrantes que participaram do ato criminoso.

Em linhas gerais, no campo cível, como a regra é da responsabilidade por ato pessoal, o administrador somente será responsabilizado excepcionalmente se não agir de forma diligente, zelosa e colaborativa. Trata-se do ônus daquele que cria e administra o grupo.

 

[1] O nome do aplicativo whatsapp surgiu de um brocardo inglês coloquial “what´s up?” em que um dos interlocutores indaga ao outro se está tudo bem, se há alguma novidade ou se está acontecendo algo.

[2] Artigo 5º, V da Constituição Federal.

[3] Artigos 186 e 927 do Código Civil.

[4] Artigo 187 do Código Civil.

[5] Artigo 932 do Código Civil.

[6] Processo nº 1004604-31.2016.8.26.0291