A relação familiar se inicia a partir da casa do uchinanchu (no dialeto de Okinawa, é a pessoa que é natural de Okinawa) na parte de cima do portão da entrada, encontramos duas estátuas de shissás (leões protetores, que espantam os maus espíritos), no lado esquerdo é a fêmea e o da direita é o macho. Entrando pelo lado direito deparamos com a ala social da casa, a sala e os quartos, nos dirigindo para o lado esquerdo encontramos todo o ambiente de trabalho, que é a cozinha, e a área de serviço…
No interior da casa, na cozinha encontramos o Hinukan que é o santuário da energia do fogo cósmico compondo o lado feminino da casa, na sala está o Tokonomá representando a estrutura principal da casa, e ao seu lado fica o Butsudan com os Ihai representando a linhagem familiar, este é o lado masculino da casa.
No costume familiar os comportamentos são diferenciados entre o homem e a mulher, sendo o homem a razão e a mulher a espiritualidade, ela é a dona das minúcias, da religiosidade e da ação social, é a pessoa que também lembra o marido das datas importantes dos aniversários, missas, festas e etc.
Assim como no Reino de Ryukyu – Okinawa, o rei era assessorado por uma conselheira principal Kikoe Oguimi, representada pela sua irmã ou mesmo a sua mãe, já nas vilas existia uma relação com as sacerdotisas e xamans, que davam amparo social e familiar, funções estas sempre exercidas por mulheres.
Externamente a ação do homem é a referência no trabalho e atividades sociais, porém, sempre se completando com o apoio da mulher pela sua ação intuitiva, como a pesca na região de Itoman em Okinawa, o homem era o que trazia o produto, e as vendas eram feitas pelas mulheres nos mercados.
Esta ação podemos também notar entre os imigrantes okinawanos, centenas de famílias se concentraram na região do Mercadão de São Paulo, onde ali as mulheres faziam comércio, vendendo frutas, verduras e legumes, até hoje muitas famílias ainda continuam com box no Mercado Municipal. Assim como muitas senhoras vendiam alho e especiarias, sobre um caixote de madeira nas feiras livres, outras eram mascates que vendiam roupas de porta em porta. Na agricultura foram as famosas “D. Maria”, que saiam pela cidade com seus cestos ou mesmo tabuleiros sobre suas cabeças, cheios de verduras e legumes.
Assim, graças a estas ações de “trabalho de formiguinha”, dezenas de famílias instalaram suas chácaras, principalmente nas margens dos rios ou mesmo riachos, nas regiões da Vila Prudente, Tatuapé, Cachoeira, Fazenda da Juta e Santo André, que hoje se tornaram áreas urbanas muito valorizadas, como a avenida Salim Maluf, a avenida Professor Luiz Ignácio de Anhaia Melo, avenida Sapopemba, marginal Tietê e rodovia Fernão Dias.
Da pequena atividade agrícola e comercial, as famílias tiveram a oportunidade de dar estudo aos filhos e trabalho na cidade. Completando assim o comportamento de uma comunidade que veio do outro lado do mundo, e pode se desenvolver num ambiente estranho, por meio do trabalho do homem e da mulher.
São diferenças que se compõem para fortalecer uma unidade familiar. Existe uma tradição dos antigos costumes de Okinawa, em que o filho primogênito herda a casa e a filha mais velha é considerada Unai Gami a santa maior protetora familiar, tanto que alguns imigrantes trouxeram consigo, um tufo de cabelo da irmã mais velha, para a sua proteção.
SHINJI YONAMINE é palestrante da cultura e tradições de Okinawa. E-mail: shinjiyonamine9@gmail.com.