Opinião: Gente sem amanhã

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É natural que jovens não se preocupem tanto com o amanhã, quando a velhice chegar. Com justa razão, e todos nós passamos por isso, os jovens querem aproveitar o presente, querem viver intensamente as delícias que esta fase da vida proporciona, sem grandes preocupações com um futuro tão distante que não faz parte ainda nem do imaginário deles. Até a minha geração, isso acabava entre 25 e 30 anos quando a responsabilidade de sustentar uma família, de dar educação aos filhos e de prevenir-se para a velhice fazia com que as pessoas mudassem sua forma de encarar a vida…

Nelson FukaiO problema é que nos dias de hoje as pessoas estão estendendo a juventude para além dos 40 anos de idade, vivendo irresponsavelmente e esquecendo que a única coisa que não para no mundo é o tempo. Vão vivendo romances seguidos, quase sempre com geração de filhos com parceiros diferentes, gastam praticamente tudo o que ganham e vão caminhando para uma velhice sem pouco ou nenhum tipo de poupança ou previdência. O futuro está quase chegando para essa geração e certamente vai se tornar um grande problema social.

E é entre os dekaseguis, que este problema pode se tornar crônico nos próximos anos. O fenômeno dekasegui teve sua explosão quando duas situações aconteceram simultaneamente. Com a população envelhecida, o Japão estava com falta de trabalhadores para fazer funcionar suas fábricas e a crise econômica que imperava no Brasil arruinava negócios e desempregava muita gente. Isso aconteceu nos anos 80 e 90 do século passado. Juntando a fome com a vontade de comer, dezenas de milhares de nikkeis foram trabalhar no Japão, uns forçados pela situação, outros também pelo espirito de aventura. No começo ficaram deslumbrados com os altos salários que recebiam, muito mais do que poderiam sonhar no Brasil. Os precavidos, os conscientes, fizeram economia e investiram no Brasil em imóveis, pagaram a previdência e fizeram uma boa poupança. Voltaram para o Brasil, alguns abriram negócios, e tem rendimentos que lhes garantem viver uma velhice tranquila.

Mas muitos, irresponsavelmente, passaram a viver como se não tivesse amanhã. Além de não fazerem nenhum tipo de economia ou investimento e de não terem contribuído com a previdência, no plano pessoal passaram a ter uma vida de poucos compromissos. Longe do Brasil livraram-se do freio da vigilância da sociedade e foram se juntando e separando seguidamente, no mais das vezes deixando filhos pelo caminho. Se na época contavam com 30 a 40 anos de idade, hoje são pessoas de 60 a 70 anos. Já não conseguem desempenhar as funções mais rentáveis e com a diminuição da renda estão sendo obrigados a voltar para o Brasil. Com a vida bagunçada e tendo que conviver com esposas descontentes, ex-esposas exigentes e filhos desgarrados e problemáticos, alguns dekaseguis retornaram ao Brasil e já estão se tornando problema sério, por enquanto restrito ao âmbito familiar. Ainda são casos esporádicos, mas tendem a aumentar futuramente, o que certamente vai se transformar em problema social dentro da comunidade. Não demora muito e a comunidade vai ser chamada a  contribuir para a assistência a idosos ex-dekaseguis, que sem renda digna e abandonados pela família, não terão outra forma de sobrevivência.

Temos vistos políticos e personalidades de destaque da comunidade nikkei do Brasil preocupados e trabalhando em melhorias para os dekaseguis. Mas este assunto não tem disso focado, talvez porque trata-se de intromissão na vida pessoal. Afinal cada um é livre para fazer o que quiser da sua vida, mas deve também responder pelo que fez. É o caso de falar agora para essas pessoas, como no conto da cigarra e formiga: só ficou cantando enquanto era jovem, agora dance!!!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br.