ANÁLISE: FALÊNCIA NO SISTEMA DE SAÚDE

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A Constituição Federal de 1988 universalizou a saúde colocando-a como direito de todos e dever do Estado, assegurando o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Para tanto, a Constituição previu a instituição de um sistema único de saúde – SUS – mediante ações e serviços públicos de saúde integrados em uma rede regionalizada e hierarquizada.

HaradaPara custear o SUS, a Constituição instituiu fontes de recursos originárias do poder público como seguem: (a) a União deverá destinar o mínimo 15% do total da receita líquida do exercício; (b) os Estados e o Distrito Federal devem destinar o equivalente a 12% de seus impostos, incluídos aqueles transferidos pela União; (c) os Municípios devem destinar 15% do produto de arrecadação de seus impostos, incluídos aqueles transferidos pelos Estados e pela União.

Como se vê, é uma verdadeira fábula de dinheiro que se bem gerido poderia propiciar a todos os necessitados uma assistência à saúde do primeiro mundo. Mas, não é o que acontece na prática. Milhões de usuários do SUS não conseguem obter todos os remédios de que necessitam, nem serem atendidos nas unidades médicas (postos de saúde e hospitais), nos casos de urgência, sem amargar uma longa e cansativa espera. É comum ver partos feitos nos corredores de hospitais ou pronto socorros, sem disponibilidade de leitos. As intervenções cirúrgicas, quando necessárias, são marcadas com meses, às vezes, com mais de um ano de atraso. Doenças que poderiam ser curadas acabam evoluindo para o estágio terminal, quando não tem mais o que fazer. Muitos morrem na fila dos hospitais públicos.

Fora da rede pública dificilmente o doente consegue atendimento em redes privadas, apesar de a Constituição prever a possibilidade de participação das instituições privadas no SUS em caráter complementar. Para isso, a Constituição imuniza de tributos essas instituições de saúde, deixando de recolher bilhões de reais. Na rede privada, os hospitais mais conhecidos, alguns deles reconhecidos pela comunidade internacional como os melhores do mundo, têm origem em comunidades étnicas. Dentre outros, podemos citar o Hospital Israelista Albert Einstein (SP); o Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP; o Hospital Moinhos de Vento (RS) fundado pela comunidade alemã; o Hospital Sírio Libanês (SP); o Hospital Beneficência Portuguesa (SP) e o Hospital Santa Cruz (SP).

Contudo, esses Hospitais, apesar de todos eles se qualificarem como sendo de natureza filantrópica ou beneficente dedicam apenas uma parcela mínima de sua estrutura material e pessoal no atendimento à população carente. A Beneficência Portuguesa é a única que mantém o Hospital Santo Antonio voltado exclusivamente para o atendimento a pacientes do SUS. Somente neste Hospital um operário pode ser atendido, mesmo tendo ambas mãos intactas.

A Constituição objetiva a instituição de um sistema hospitalar composto de redes de hospitais públicos e privados, a fim de tornar efetiva a universalização do direito de assistência médico-hospitalar. Mas, estamos muito longe de alcançar esse objetivo. É tempo de repensar a montanha de dinheiro retirados dos contribuintes, bem como a fabulosa soma de tributos que o poder público deixa de recolher das instituições hospitalares privadas. É tempo de avaliar o custo-benefício. E isso vale para outros setores, como o religioso, o assistencial, o educacional e o empresarial contemplado com incentivos fiscais de toda sorte, sempre com a origem em medidas provisórias espúrias.

Kiyoshi Harada é jurista com 31 obras publicadas, acadêmico e Presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social. E-mail: Kiyoshi@haradaadvogados.com.br.