Bebida e direção

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Causou estranheza a crônica do jornalista Jânio de Freitas na Folha de São Paulo de Abril passado, com o título de “Elitismo autoritário”…

Por Nelson Fukai

O sempre ponderado jornalista, desta vez pisou feio na bola. Batendo na tecla de que a lei seca é contra a classe média, ele desfila uma série de estatísticas fajutas e justificativas inócuas, dignas de um sujeito que escreveu o artigo completamente bêbado ou que quis pregar uma peça de primeiro de abril.

Diz o artigo que “quem bebe um ou dois copos de vinho em várias horas de um jantar, compõe a maioria dos atingidos”. Provavelmente o jornalista deve viajar para Marte nas sextas e sábados. Principalmente nestes dias da semana, mas também nos outros, nos botecos, bares e restaurantes da cidade, os representantes da classe média enchem a cara com todos os tipos de artefato etílico, não como distensão ou lazer, como diz o artigo, mas porque a sociedade trata a ingestão de álcool como costume e não como vício. Esses são os que formam a maioria que a lei seca quer atingir. Porque eles tem carros potentes e se acham imunes à lei. Se causarem acidentes, matando gente inocente, quando muito vão ter algum aborrecimento, nunca uma punição rigorosa.

O jornalista argumenta de forma discriminatória que as blitze não são feitas na periferia, onde seria farta a coleta de desrespeito ao índice exíguo da lei. O motivo, diz ele, é porque a lei tem como alvo apenas a elite. Pode ser que na periferia o consumo de bebida seja mais alto, mas a maioria volta para casa a pé ou de ônibus. E se num fusca 76 ou numa Kombi 80, um pobre bêbado se envolver em acidente com morte, com certeza vai para cadeia, com lei seca ou não. Aliás, pobre neste país vai para cadeia até quando não provam nada contra ele, imaginem quando sai do carro cambaleando. Não precisa nem de bafômetro ou de exame de sangue, é cana na certa. Não contente, o jornalista bate depois nos motoristas de ônibus e de caminhão que, segundo ele, causam dezenas e mais dezenas de mortos, feridos e incapacitados e apesar disso foram poupados pela lei. Não sei de onde ele tirou isso, uma vez que a fiscalização nas estradas para identificar embriagados e usuários do chamado rebite (droga usada para espantar o sono) é bastante rigorosa. E acidentes de estrada não acontecem só com ônibus e caminhões (que em parte é devido à má conservação das estradas), mas principalmente com veículos de passeio (quase sempre envolvendo motorista embriagado).

E para coroar “a pisada” o jornalista afirma que está mais do que provada a ineficácia do autoritarismo como sistema socialmente educativo. O que pode mudar as condutas sociais, segundo ele, é a persuasão. Pois é, durante anos os brasileiros foram aconselhados a utilizar o cinto de segurança, mas precisou de lei para virar costume. O mesmo se aplica ao fumo no ambiente de trabalho e depois em ambientes fechados. Perguntem aos japoneses e alemães das penalidades a que estão sujeitos se forem pegos embriagados ao volante. Não tem nada de persuasão, é a certeza de que vai pagar pesadas multas e cumprir pena na cadeia que faz com que nesses países seja difícil flagrar motorista embriagado. Já que ele acha que a persuasão é o melhor caminho, bem que poderia tentar persuadir as torcidas organizadas a serem mais pacíficas.

Nada temos a ver se um sujeito se entope de álcool, de nicotina ou de crack. O livre arbítrio existe para isso, cada um faz o que bem entender de sua vida. Só não é justo que os problemas decorrentes do uso destas porcarias sejam classificados como de saúde pública e dinheiro público seja usado para tratamento médico- hospitalar desses viciados. E menos justo ainda é não termos leis que punam os que, usando do livre arbítrio de consumir álcool, venham a colocar em risco a vida de inocentes no volante de um carro. Infelizmente este é um país onde todo dia é primeiro de abril!!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br