Estamos atravessando o segundo ano consecutivo de desequilíbrio das contas públicas, apesar da forte taxação agravada com uma avalanche de normas complexas e confusas, redigidas com requintes de inusitado sadismo burocrático que tomam do contribuinte brasileiro 3.600 horas anuais de trabalho, para cumprir todas as obrigações tributárias. Isso tem encarecido o preço de nossos produtos e serviços, afastando o Brasil do mercado de concorrência internacional neste mundo globalizado…
Sem examinar as causas do déficit orçamentário, o governo, assessorado por curiosos em matéria de governança, está promovendo o ajuste fiscal pelo lado da exacerbação do nível de imposição tributária de há muito saturado, ao invés de reduzir os gastos públicos de sorte a propiciar uma situação que permita reduzir os tributos.
Assim é que não satisfeito com a pretendida recriação da nova CPMF, que tem como destinatária do produto de sua arrecadação a Previdência Social e não a Saúde, como tem apregoado a astuta governante, está lançando mão de impostos regulatórios atribuindo-lhes caráter arrecadatório, incorrendo em desvio de finalidade. Daí o aumento do IOF, do II e agora do IPI à sombra do dispositivo constitucional que permite o Executivo aumentar as alíquotas no cumprimento de suas funções ordinatórias. Só que, para promover o aumento de alíquotas visando a obtenção de recursos financeiros, o governo não pode prescindir de autorização legislativa, sob pena de cometer ato de improbidade administrativa por praticar ato diverso daquele previsto na regra de competência (art. 11, I da Lei nº 4.729/92).
A via eleita pelo governo para curar a dor de barriga que ele próprio provocou vai custar caro à sociedade brasileira, com o agravamento da crise econômico-social e da crise política dela decorrente, implicando paralisação parcial de nossas instituições públicas. Se agisse ao contrário, isto é, reduzir os tributos, a economia voltaria a crescer, assim como a arrecadação. Só um cego não enxerga o óbvio.
Por força da desaceleração industrial, milhares de pessoas estão perdendo o emprego, o que acarreta a perda do poder aquisitivo da população que, por sua vez, gera a retração do consumo, dando origem à falta de confiança dos empresários, concorrendo para instalar um círculo vicioso de acontecimentos negativos de desfecho imprevisível.
Urge, pois, reorientar a política de ajuste fiscal, partindo para a efetiva redução de gastos públicos a começar pelo enxugamento de órgãos e instituições sobrepostos para acomodar milhares de servidores de servidores não concursados que causam múltiplos efeitos negativos: (a) surgimento de servidores fantasmas que só comparecerem à repartição pública para receber; (b) má qualidade dos serviços por eles prestados por falta de preparo técnico-profissional; (c) aumento da corrupção no seio do funcionalismo por ausência de controle hierárquico, pois o servidor nomeado sem concurso deve obediência apenas a quem o indicou; (d) desestímulo dos servidores efetivos descolados para cargos de quarto ou quinto escalão.
Outrossim, deve reduzir drasticamente as despesas com intermináveis e fantásticas viagens de autoridades ao exterior, cujos integrantes ficam sempre hospedados nos hotéis mais caros do planeta; eliminar ou minimizar o uso indiscriminado de cartões corporativos; interromper o ciclo de vantagens pessoais intermináveis de servidores e agentes públicos que driblam o teto constitucional de vencimentos. Enquanto não se fizer o corte de despesas públicas o brasileiro continuará trabalhando apenas e tão somente para pagar a folha e os juros da dívida pública que já atingiram a estratosfera.
Kiyoshi Harada é jurista, acadêmico com 31 obras publicadas e Presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social..