Coisas que a morte ensina

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Vivemos pequenos momentos de morte todos os dias: a conclusão de um trabalho, o término de um namoro, o final de um ano, etc. Mas quando ela aparece de forma concreta, como a morte de minha mãe, ela realmente nos sacode

Por Meiry Kamia

Na madrugada do dia 24 de dezembro de 2011, minha mãe, Miyako Kamia, mais conhecida como Helena Kamia, 66 anos, faleceu fazendo o que mais amava na vida: shows de mágicas. No camarim, entre um número e outro, teve um AVC. Foi tudo muito rápido. Entre o mal estar, socorro e morte, foram cerca de 4 horas.

Quando alguém tão amado, que ocupa um espaço tão especial em nossos corações morre, a sensação que temos é que um pedaço de nós foi embora junto.  E como preencher esse grande vazio que fica em nosso peito? É sobre isso que quero falar.

Nenhum de nós passará imune pela morte. Todos nós iremos morrer e todos nós, em algum momento de nossas vidas, iremos perder alguém muito especial, seja um pai, uma mãe, um filho, um amigo querido. Portanto, se temos que passar por isso, talvez seja porque existe um grande aprendizado por detrás desta experiência. Na verdade, a morte nos ajuda a repensar a vida.

Minha mãe era uma figura muito alegre, alto astral, sempre disposta a oferecer palavras de apoio e ânimo àqueles que necessitavam, o que deixou uma marca muito positiva na vida de muitas pessoas.  Isso nos faz pensar “que marca estou deixando nesse mundo?”, “como gostaria de ser lembrado?”. Mesmo sem saber, o tempo todo estamos deixando nossa marca nesse mundo, estamos entregando algo para as pessoas. Algumas pessoas entregam sorrisos, alegria, palavras de suporte, outras entregam reclamações, mau humor e tristeza. Mas a pergunta é “o que você está entregando diariamente para o mundo à sua volta?”

A morte também nos faz refletir sobre a qualidade dos relacionamentos que mantemos em nossas vidas. Para muitas pessoas, a morte de alguém querido traz angústia. A angústia é um sentimento de pesar por algo que não se pode mais realizar. São palavras que o morto não poderá ouvir, questões que não poderão ser resolvidas, e momentos bons que não poderão ser vividos, porque agora fazem parte do passado e o passado não muda.

Isso nos faz pensar sobre o quanto “empurramos com a barriga” questões importantes que devem ser resolvidas no momento presente. Esquecemos que somos finitos. Também nos faz pensar sobre o quão importante é viver o momento presente, pois é nele que vivenciamos os verdadeiros momentos de felicidade.

Sendo assim, a morte nos ensina que devemos aprender a valorizar pequenos momentos, palavras e gestos em situações do cotidiano. Pude “curtir” muito a minha mãe cozinhando e lavando louça junto com ela, conversando sobre coisas da vida. Era um prazer tomar nosso chá após o almoço, sair para cantar no karaokê, e ver os olhos dela brilharem! Compartilhar de sua alegria e companhia era sempre um prazer! E agora, com sua ida, aquela parte do meu coração que se foi junto com ela, agora é preenchido por essas boas recordações de alegria e troca de amor.

Relembrar os momentos bons faz com que nosso coração se encha de amor, e isso acalenta e cura qualquer dor. Mas é preciso ter tido esses bons momentos, para que eles possam ser relembrados. Portanto, outro ensinamento que a morte nos traz é “viva cada dia como se fosse o último. Viva conscientemente e intensamente. Agradeça o privilégio de estar vivo e valorize cada momento com cada pessoa que passar pelo seu dia. Olhe nos olhos, abrace, toque, sinta que está vivo e passe essa vida para as pessoas!”

Muitas pessoas sofrem mais do que o necessário com a morte do outro porque, de alguma forma, sentiam-se dependentes, financeiramente ou psicologicamente. É comum sentir raiva do morto porque vem a sensação de desamparo que parece dizer “como você pôde fazer isso comigo? Por que me abandonou? Por que me deixou aqui sozinho?”. Lidar com isso é a outra lição que a morte nos traz.

A morte nos relembra que somos seres únicos. Por mais que convivamos em sociedade, somos seres individuais. E amadurecer significa aprender a carregar o próprio peso. A pessoa que se foi sempre deixa um “buraco” em nossas vidas e ele precisa ser preenchido. Ao preenchermos esses espaços nós crescemos! Portanto, para você que é pai e mãe, cumpra o seu papel de educador, prepare seus filhos para serem independentes, de forma que eles não sofram tanto na sua falta.

Sempre digo que, para aqueles que ficam, é como se Deus desse uma oportunidade para revisar suas próprias vidas e mudar, caso seja necessário. Aprender coisas novas, portar-se diferente, relacionar-se diferente. Aproveite a oportunidade!

A morte nos ensina a sabedoria. Sabedoria só vem com a experiência. É preciso passar por ela para saber como é. É por isso que nenhum de nós está isento disso. Grandes lições da vida vêm com os momentos mais difíceis. Saber passar pelas experiências retirando o melhor delas, isso é sabedoria. Isso vale para qualquer coisa na vida. Se a situação é ruim, pense “o que estou aprendendo com isso?”, pois de alguma forma você está sendo fortalecido.

Para finalizar, em nome de toda FAMÍLIA KAMIA, gostaria de agradecer a minha mãe, à ela dedico esse texto. Agradecemos pelo privilégio de ter tido uma pessoa tão iluminada em nossas vidas e que cumpriu magnificamente sua própria missão de vida. Com sua conduta e palavras nos ensinou a ter esperança nos momentos mais difíceis, mais tarde descobrimos que isso significava Fé. Fé é a capacidade de “Crer Sem Ter que Ver”, é ter a confiança de que tudo dará certo no final. Nos ensinou que o Amor liberta, que todas as pessoas com as quais nos relacionamos cumprem um papel em nossas vidas e quando terminam sua função, precisam ir. Amar significa permitir que as pessoas entrem e saiam de nossas vidas quando necessário. O amor se torna egoísta quando teimamos em aprisionar as pessoas mesmo quando isso não é mais positivo nem para nós nem para elas. Bem viver é viver intensamente nossas vidas, sabendo retirar o melhor que as pessoas têm a nos oferecer e, com muita gratidão, guardar esses bons momentos em um lugar especial em nossos corações, de modo que não precisamos ter as pessoas fisicamente o tempo todo ao nosso lado, e sim, em nossos corações.

“Mãe, minha querida, fique com Deus! Nosso coração está repleto de amor para você! Obrigada por tudo! Esteja em Paz porque estamos em Paz! Amém!”

MEIRY KAMIA é psicóloga, mestre em Administração de Empresas, consultora organizacional e docente em MBA Executivo de Gestão de Pessoas. www.hvalue.com.br