Direito de Todos

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… “Todos nós temos direitos que vão até onde começam os direitos dos outros”…

Por Nelson Fukai

Quando estava no grupo escolar, e isso já faz um bom tempo, a mais importante lição de moral passada pelas professoras era: “ todos nós temos direitos que vão até onde começam os direitos dos outros”. Para nós, nikkeis, isso não era novidade uma vez que nossos pais sempre nos orientaram para agir de forma a não prejudicar os outros. E durante muito tempo a maioria das pessoas agia segundo esta filosofia, o que tornava o relacionamento das pessoas muito mais harmonioso.

Pois é, mas os tempos são outros. A ultra valorização da vulgaridade estimulada pela mídia somada ao egoísmo desenfreado, acabaram sepultando a solidariedade, o espírito coletivo e a gentileza. Hoje, a grande maioria dos brasileiros vive na base do “primeiro o meu, segundo o meu e terceiro o meu também”. Não existe a mínima preocupação com o direito alheio, se puder levar qualquer tipo de vantagem o brasileiro pisa até na mãe (aliás, nunca tantos filhos mataram tantos pais e nunca tantos pais deserdaram tantos filhos). Não dá para precisar exatamente quando começou o processo desta derrocada moral, mas certamente foi durante a ditadura militar. Para que o povo não se ligasse nos desmandos que praticavam, os militares censuravam livros, músicas, revistas e filmes sérios e começaram a incentivar a produção de filmes pornô-eróticos, novelas degradantes e tudo mais que enlameasse a ética e a moral. E em todos os enredos, quem fosse gentil e honesto acabava se dando mal, os safados é que eram valorizados. Como resultado dessa lavagem cerebral, o brasileiro ficou muito mais egoísta e muito mais materialista. Nos anos 70 do século passado ficou famosa a frase do ex- jogador Gerson em um comercial de TV, no qual ele dizia: ”tem que levar vantagem em tudo, certo?” Isso retratava bem um processo que se iniciava e era estimulado pelos militares e pelos que detinham o poder econômico. E daí em diante a coisa foi piorando chegando ao deplorável padrão de relacionamento entre as pessoas que temos hoje. A vida, principalmente nas grandes cidades brasileiras, tornou-se uma guerra, onde todos são inimigos de todos, onde um simples atravessar de rua ou mesmo uma viagem de metrô ou ônibus, tornam se disputas para ver quem leva mais vantagem. Para não perder cinco segundos, motoristas avançam sobre pedestres e pensando apenas no próprio conforto, jovens saudáveis não cedem lugares para idosos, gestantes e deficientes. E este tipo de procedimento se repete em todos os lugares e em todas as ocasiões e em todas as classes sociais. O mais grave é que a grande maioria dos que estão no poder, seja no executivo, no legislativo ou no judiciário, faz tudo pensando apenas no seu próprio benefício. Mas somos nós os culpados, afinal, os políticos estão lá com o nosso. Uma vez instalados no poder fazem conchavos com o judiciário, de forma a manterem todas as benesses e as mordomias custeadas com dinheiro público.

Tem jeito de mudar? Sim, mas é longo e penoso o caminho. Precisamos ensinar para nossas crianças os limites e obrigá-las a obedecer, com carinho e amor, mas com muita firmeza. E não ter medo de apontar os seus erros. A vida não pode ser moldada em função das vontades das crianças. Elas precisam a aprender a ter frustrações, a terem os seus erros apontados e serem castigadas quando ultrapassam os limites. Beliscão e palmadas nunca machucaram ninguém (não confundir com surras). Ao contrário, formam cidadãos conscientes. É ruim quando uma pessoa pratica um crime consciente de que fez uma coisa errada. Mas pior é quando um sujeito nem tem mais noção do que é certo ou errado. Só isso explica porque tantos assassinos nada sentem quando tiram do outro seu bem mais importante: a vida. E muitas vezes este outro é seu pai, seu irmão ou seu amigo. Outra mudança na educação das crianças é diminuir o tempo que ficam em frente de uma TV, de um computador ou de um joguinho eletrônico. Incentivar a prática esportiva, o bom diálogo e qualquer tipo de arte. E, naturalmente, valorizar o estudo e o trabalho, acabando com a glamorização da vida fácil de artistas e esportistas de sucesso. Enfim, formar cidadãos que saibam viver harmoniosamente com outras pessoas, que sejam gentis e trabalhadores e que tenham consciência das coisas importantes da vida. Só assim um dia este país terá o tão almejado desenvolvimento harmonioso e sustentável!!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br