Hajichi – tatuagem, que identificava a mulher casada e também a vila onde morava. Somente as okinawanas faziam o hajichi, outras japonesas, não
Por Shinji Yonamine
No ano passado, participamos do encontro mundial dos uchinanchus (okinawanos), o Sekai no Uchinanchu Taikai, e o que mais fazíamos, por nos despertar muito interesse, era discutir a cultura, costumes e tradições de Okinawa, em uma reunião com amigos, conversávamos sobre algumas particularidades de nossa comunidade. Uma delas foi a tatuagem nas mãos de nossas avós, o hajichi – tatuagem, que identificava a mulher casada e também a vila onde morava. Somente as okinawanas faziam o hajichi, outras japonesas, não.
Assim, voltando ao passado, nos relatos sobre Ryukyu, sabemos que Okinawa era uma terra de mercadores. Eles utilizavam-se da movimentação dos ventos e dos mares do Sul da Ásia, para navegarem. No porto de Naha, ancoravam vários navios estrangeiros, do Sudeste Asiático os mercadores traziam artesanato, arroz, enxofre e marfim, da China a batata doce e uma parte da cultura chinesa, do norte as algas marinhas. Se pensávamos que Ryukyu era um arquipélago isolado, através desses fatos percebemos que os antigos mercadores de Okinawa formaram intensa rota de comércio. Na época, o Japão passava por um período de turbulência política e social e ficou fechado para o mundo.
O hajichi foi uma forma de preservar e proteger as mulheres, pois, uma vez seqüestradas seriam de fácil comercialização, com a tatuagem era possível que os mercadores okinawanos identificassem essas mulheres, caso fossem raptadas e vendidas em outros pontos da Ásia.
No contexto da imigração, as mulheres nascidas no fim do século XIX, mantinham essas tatuagens nas mãos, que eram desconhecidas por outras comunidades japonesas. Como a tatuagem no Japão é ligada ao submundo, talvez o hajichi tenha sido um dos fatores que culminou no desprezo da comunidade japonesa em relação a comunidade okinawana, juntamente com outras diferenças entre esses povos, como a língua de Okinawa, os traços da feição mais marcantes, e sua pele mais morena, distintas da fisionomia japonesa.
No Brasil, a tinta do hajichi foi desaparecendo das mãos de nossas mulheres, mas estão marcadas em nossa memória, na lembrança das mãos delas, que lutaram pela prosperidade e pelo espaço do okinawano em nosso país.
Essas mulheres trouxeram para o Brasil, o modo de vida okinawano em que os homens trabalhavam na agricultura ou na pesca, e as mulheres comercializavam o produto. Isso aconteceu também no Brasil, nas chácaras da periferia das cidades, os homens criavam porcos ou plantavam verduras e as mulheres saiam para vender seus produtos, carregando em grandes tabuleiros. Por conta disso, muitas pessoas viam as okinawanas trabalhando nas ruas e só viam os homens em seu horário de lazer, quando saíam das chácaras para beber e encontrar seus amigos, por este motivo, passava se a impressão de que os okinawanos não trabalhavam, somente suas mulheres.
Também através do hajichi, o okinawano protegia o que tinha de mais precioso, a sua mulher que além de trabalhar, era ela quem cuidava da vida doméstica e das relações sociais da família. Ouvir histórias de uma obachan, nos ensina muito sobre a vida do imigrante, seus sofrimentos e conquistas.
Há histórias de lideres, mas não de suas mulheres, que lutaram e sofreram tanto quanto eles, devemos agradecer às obachan, grandes batalhadoras e submissas, que conseguiram deixar um grande legado, a família okinawana…
SHINJI YONAMINE é Palestrante e aborda questões históricas sobre Okinawa. Email: shinji.yonamine@uol.com.br.