Cada vez mais consolidado, karaokê é elo forte da comunidade nipo-brasileira
Fotos: Silvio Sano
A cultura japonesa está mais que consolidada em São Paulo. Talvez, no Brasil. Mas, em terras paulistas, é comum escolher como passeio de fim de semana um evento que resgata parte do legado deixado pelos pioneiros da imigração, há 106 anos. Fruto de um trabalho árduo de voluntários que se movimentam para divulgar aspectos tão admirados pelos ocidentais: artes marciais, dança, música, gastronomia, entre outros. Nesse contexto todo, uma das expressões mais marcantes, atualmente, é o karaokê. Tão atuante que movimenta milhares de pessoas, seja nas festas familiares, encontros de amigos, casas noturnas e bares, bem como os concursos espalhados pelo país todo.
Neste último quesito, quem acompanha os eventos da comunidade conhece bem a dimensão e o poder da música japonesa no Brasil. Há mais de 20 anos, concursos reunindo cantores amadores acontecem nas entidades e associações ligadas aos nipo-brasileiros, para manter o espírito de coletividade e harmonia, princípios básicos daqueles que desembarcaram no Brasil há 106 anos. Um dos mais influentes é o Paulistão, que aconteceu em fevereiro e reuniu a “nata” dos cantores da comunidade. Uma festança e tanto para celebrar, justamente, a música japonesa que tanto é interpretada pela comunidade nipo-brasileira.
Na cidade de Jacareí, no interior paulista, centenas de cantores soltaram a voz durante três dias de concurso. Dos intérpretes-mirins aos cantores da melhor idade, tudo é motivo de festa para quem sobe no palco e, por alguns minutos, desfila suas técnicas para o público. O resultado, no fundo, não é obter a primeira colocação. Claro, sempre é bom ser reconhecido como o melhor de sua categoria, porém, vale mesmo é participar e marcar presença na celebração à música e cultura japonesa.
“O canto é uma forma de integrar as pessoas, de trazer harmonia e preservar os valores culturais. Nosso reconhecimento a todos aqueles que, de alguma forma, estão envolvidos neste projeto, na realização do evento. Toda a parte voluntária que move o karaokê e os concursos faz parte de uma história da nossa comunidade. Por todo esse esforço, só podemos agradecer imensamente. Não é fácil realizar um concurso deste porte”, afirma o presidente da UPK, Toshio Yamao. Ele, que já está há anos participando do “movimento ligado à música japonesa no Brasil”, constata que, de fato, a mobilização de 620 cantores, sem contar dirigentes e associações que vêm dos mais distantes pontos do estado, mostram como é forte o engajamento. “Aos cantores, nossa gratidão pela participação e sacrifícios. Muitos chegam de cidades muito distantes, mas fazem questão de participarem. Sempre em clima de confraternização e amizade.”
Na mesma linha, o coordenador geral do evento, Mario Sakamoto, concorda que o Paulistão é uma referência na comunidade. Para ele, que se emocionou no palco durante a abertura, “muito trabalho foi feito para resultar no melhor”. “O Paulistão é parte importante na divulgação e promoção da cultura japonesa no Brasil. Gostar das canções não basta para aqueles que fazem da música sua razão de viver, pois, é muito mais que um hobbie ou lazer; trata-se de um momento único ao subir no palco”, complementa ele, que passou dias sem dormir, justamente para cuidar de todos os detalhes. “Foram dias cansativos, porém, muito recompensadores.”
Campeão dos campeões
Carismático e versátil, Alexandre Hayafuji é o melhor cantor do Estado
Todos que cantam, brilham. Isso é fato indiscutível no mundo do karaokê. Todavia, todo grande concurso há um campeão absoluto, aquele que arrepia o público com sua interpretação emocionante e, tecnicamente, perfeita. Sim, pois, em todo grande concurso como o Paulistão, um seleto grupo de jurados avaliam desde a técnica vocal à pronúncia da letra entoada. Nesse conjunto todo, o cantor Alexandre Hayafuji foi o mais perfeito, obtendo, assim, o título de melhor cantor do Estado de São Paulo.
Não é um título pequeno. Hayafuji concorreu com cantores do mais alto calibre. Ele mesmo, que havia encerrado as participações em concursos, voltou à ativa há pouco tempo. E mostra que o timbre aguçado e a emoção em cima do palco conquistam qualquer tipo de ouvido.
“Foi uma emoção muito grande voltar a ganhar o título. É uma conquista bastante valiosa na carreira”, sintetizou o campeão, logo após receber o troféu. Além dele, participaram do Grand Prix (espécie de finalíssima reunindo os campeões de todas as categorias) cantores “de peso” e que treinam durante o ano inteiro para fazer o melhor no Paulistão. Desta vez, contudo, Hayafuji se sobressaiu. “Graças ao empenho e ajuda de muitos amigos, conquistei este título. Agradeço todo o carinho e apoio”.
No total, já são cinco títulos no Paulistão, um marco que o coloca como o “campeão dos campeões” do evento. Além de vencer em sua categoria e no Grand Prix, Hayafuji também levou o prêmio pela maior nota da Capital. Prova de que o talento musical está mais do que evidente. Sua longa trajetória de destaque no karaokê mostra o porquê: desde cedo, estava nos primeiros lugares do concurso, culminando em troféus em praticamente todos os concursos que participou. No “Brasileirão”, quando reúnem-se cantores de todo o País, o cantor também já obteve o título.
Depois de ganhar quatro vezes o Grand Prix e ter conseguido, num mesmo ano, o Grand Prix do Paulistão e do Brasileirão em 2008, Hayafuji disse que se “aposentaria” dos concursos. Mas o coração não permite e a paixão o fez retornar em grande estilo. Estilo campeão de sempre, diga-se de passagem.
Movidos pela determinação
Viagem de muitas horas, treinos intensos e um objetivo: ajudar a regional a fazer bonito
Para os cantores, cantar no palco para um público grande é tarefa extremamente prazerosa, afinal, são dias de treinamento intenso para obter a melhor colocação. Para outros, porém, o período é de bastante movimentação. Trata-se das regionais, grupos formados a partir de regiões do estado, e que agregam os participantes do Paulistão. Um trabalho árduo que demanda tempo e organização.
Grande parte do trabalho de um concurso como o Paulistão fica por conta da regional responsável pelo evento. No caso, neste ano, ficou por conta da UCK (União Central de Karaokê), que contou com o apoio de diversos dirigentes locais – caso da Associação Cultural e Desportiva Nipo-Brasileira de Jacareí – que verificam desde a parte de infraestrutura até a recepção das delegações. Ações “de bastidores” que fazem parte da rotina dos grandes eventos de karaokê.
No total, são 15 entidades responsáveis pela arregimentação de cantores e estruturação do grupo para participar do Paulistão. Durante os três dias de concurso, os representantes permanecem ali para resolver problemas, orientar cantores e fazer reuniões para melhorar a parte de organização – além de prestar contas. Ações que, para muitos, passam despercebidas perante o grande público.
“Sem os trabalhos das regionais, não teríamos a força que temos hoje. São pessoas que dedicam tempo e amam o karaokê. É essa movimentação toda que faz um evento ser tão bonito”, destaca o presidente da UPK, Toshio Yamao. Esforço esse, vale ressaltar, que não tem distância: viagens de mais de 500 quilômetros são recorrentes para participar da celebração musical. “Pois é esse sentimento que faz com que continuamos nessa jornada, nessa luta. O karaokê é um patrimônio da comunidade e que vai se perpetuar muito”, comemora Yamao.