Mesmo com a crise e as dificuldades que diversos setores da economia enfrentam, o mercado de games prospera em tendência oposta. Segundo levantamento da NewZoo – uma das principais condutoras de pesquisas sobre a indústria dos games no mundo –, em 2016 o setor faturou US$ 1,6 bilhão no Brasil, um aumento de 25% em relação a 2014, deixando o país com a 11º posição no ranking mundial. Em todo o mundo, a indústria de games faturou US$ 101 bilhões, em 2016. A China, seguida por Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul, estão no topo do ranking dos maiores consumidores de games no mundo.
De acordo com a Abragames – Associação Brasileira dos Desenvolvedores de Jogos Digitais, no caso da produção nacional, “registramos no Big Festival [maior evento de jogos independentes da América Latina] negócios que vão circular cerca de US$ 19,8 milhões até o próximo ano.”
Para o professor e pesquisador do curso de Jogos Digitais do Senac/SP (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), Adalberto Bosco Castro Pereira, diversos fatores apontam para um crescimento e otimismo para o mercado de jogos brasileiro. “A Ancine [Agência Nacional do Cinema], por meio do Fundo Setorial Audiovisual (FSA), vai investir 10 milhões em projetos de games. O governo está com bons olhos ao mercado e junto com o BNDS [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] fomenta investimentos no mercado de desenvolvimento de games”, explica.
Ao todo, estima-se que existam em torno de 65 milhões de pessoas no Brasil que jogam algum tipo de game. Segundo a pesquisa Game Brasil 2017, o gamer (pessoa que joga) brasileiro se consolida com o perfil multiplataforma, ou seja, 74% jogam em mais de um dispositivo. Entre eles o mais popular é o smartphone (77,9%), seguido de computadores (66,4%) e consoles (49%). A categoria de jogo preferida foi Estratégia (50,9%), seguida de Aventura (45%). E o game com maior popularidade de 2016 foi Fifa.
Mas, outros jogos também fazem sucesso em terras tupiniquins. “Poderia citar vários, mas selecionando os mais populares, destaco o Pro Evolution Soccer; GTA – Grand Theft Auto; Counter Strike, que está no inconsciente gamer brasileiro desde sempre, uma cultura que nasceu na época das lan houses; e o famoso League of Legends – LoL, um MOBA [Multiplayer Online Battle Arena], em que dois times opostos lutam entre si e cujo objetivo é destruir a base inimiga”, enumera Matheus Zanetti, gerente de marketing da Kinship – estúdio brasileiro de desenvolvimento de games.
Outro dado relevante da pesquisa é que o número de mulheres que consomem jogos digitais no Brasil vem crescendo. Pelo segundo ano consecutivo, as mulheres são maioria entre os jogadores de games no Brasil, representando 53,6% do público. Provando que videogame é coisa é de menina sim.
Além de jogar, elas organizam e participam de campeonatos só para mulheres, e ainda se destacam como desenvolvedoras. A analista de sistemas, Mirian Ito, de 31 anos, conta que joga desde criança e em 2017 passou a praticar Overwatch, multiplayer (jogo que permite que vários jogadores participem simultaneamente de uma mesma partida) de tiro em primeira pessoa, desenvolvido pela Blizzard Entertainment. “Em maio participei, com a minha equipe, a Kill-Heal, do primeiro torneio feminino de Overwatch do Brasil. A ideia do campeonato foi unir mais as jogadoras e criar um ambiente mais saudável para as mulheres jogarem e se divertirem, já que nesse cenário ainda há muito preconceito com as meninas. Mentalidade que já deveria ter sido deixada de lado pelos homens”, adverte Mirian.
A indústria de games brasileira
Em oito anos, o número de empresas desenvolvedoras de games aumentou em quase 600%. Segundo a Abragames, em 2008, tinham 43 empresas no Brasil; em 2014 esse número estava em 130. Atualmente, são aproximadamente 300 empresas. “Se levarmos em consideração as empresas e grupos que desenvolvem games não registrados, esse número pode ser ainda maior”, lembra Adalberto.
Apesar de aquecido, o mercado de games no Brasil ainda é desafiador para os desenvolvedores do país. “A gente olha com bons olhos para o futuro, mas as empresas brasileiras ainda têm que enfrentar vários desafios para se manter no mercado”, alerta Lucas Silva, coordenador da SAGA (School of Art, Game and Animation), pioneira no ensino de desenvolvimento de jogos no Brasil.
“Para começar, a falta de experiência do mercado em si, cargas tributárias altíssimas [já que um videogame tem imposto superior a arma de fogo no Brasil], burocracia, falta de investimentos e o preconceito dos jogadores com os games brasileiros são alguns dos desafios que as empresas têm que superar diariamente”, enumera Matheus, da Kinship, que atualmente trabalha no lançamento do primeiro jogo do estúdio, o Skydome, que em breve estará disponível para PC, e marcará presença na Brasil Game Show desse ano.
“Além disso, enfrentamos o mesmo desafio do mercado global que é ter visibilidade e conseguir se diferenciar no meio de tantos lançamentos. Hoje os jogos não têm mais fronteiras. Você tem todos os games sendo lançados aqui e em todo o mundo”, completa Matheus.
A produção de jogos no Brasil é imensa e alguns games têm conseguido se destacar no mercado como o premiado No Heroes Here (Mad Mimic Interactive) e Knights of Pen and Paper (Behold Studios), que vendeu mais de 1 milhão de cópias para PC e dispositivos móveis.
Um pouco de história
Segundo a tese de doutorado de Adalberto Bosco, “Uso de jogos digitais no desenvolvimento de competências curriculares da matemática”, evidências arqueológicas mostram que diversas culturas e organizações sociais já faziam uso de jogos.
A evolução tecnológica favoreceu o nascimento dos jogos eletrônicos nos EUA, por volta de 1950. Já na década de 1970, o primeiro videogame lançado comercialmente foi o Pong, criado pelo engenheiro Al Alcorn, da americana Atari, uma das primeiras empresas de jogos da história.
O templo dos games
Considerado o berço da criação de jogos no mundo, o Japão é respeitado até hoje como o santuário dos games, de lá saíram os grandes nomes da indústria, que são reverenciados pelos jogadores de todo o mundo. Como Shigeru Miyamoto – o visionário da Nintendo, conhecido por ser o criador de algumas das mais bem-sucedidas séries de jogos eletrônicos de todos os tempos, como Super Mario e The Legend of Zelda; Naoto Oshima, criador de Sonic; Hideo Kojima, criador de games como Snatcher e Metal Gear; Takashi Nishiyama responsável por Street Fighter; Satoshi Tajiri, criador de Pokémon, Tōru Iwatani, autor de Pac-Man, entre tantos outros nomes de sucesso.
“Após a queda da americana Atari, a indústria de videogames enfrentava um declínio. E foi justamente as empresas japonesas de games, como Nintendo, com o Super Mario, e a Sega, com Sonic, que reavivaram o mercado de games no mundo”, destaca Matheus Zanetti. “Essas empresas, em especial a Nintendo, criaram a base de tudo. O mercado cresceu em cima dos games japoneses”, relata.
O que concorda Adalberto Bosco: “A Nintendo transformou o mercado de games várias vezes. Super Mario Bros. é simplesmente o jogo que revolucionou tudo na década de 1980”, conta.
De lá para cá, grandes empresas japonesas se destacaram no mercado, lançando consoles famosos e grandes games, como a Sony com o seu PlayStation, a Konami e seus games de sucesso como o Pro Evolution Soccer e Metal Gear, ou a Square Enix, desenvolvedora de Final Fantasy.
Jogos que caíram no gosto de gamers de todo o mundo, inclusive, dos brasileiros. “Gosto muito de jogos de aventura e RPG e a maioria são japoneses. Inclusive o meu preferido: Final Fantasy”, conta Erick Camigavachi, de 33 anos, que atua com tecnologia da informação.
O gerente de contas, Alexandre Santos, 31, também tem nos jogos japoneses sua grande paixão. “As minhas séries favoritas são asiáticas, como Zelda, Pokémon, Final Fantasy, Mario e Metal Gear. Me interesso muito por esse tipo de jogo devido eles apresentarem um nível de narrativa, jogabilidade e desafios incrivelmente bem feitos”, explica.
E mesmo após tantos anos, a Nintendo continua influenciado o mundo dos games e lançando tendências no mercado. Um dos exemplos mais atuais é o seu novo console, o Nintendo Switch. Um videogame híbrido, que traz a proposta de ser um console doméstico e portátil.
Além disso, a Nintendo também é responsável por jogos campeões. Como o seu game de ação/aventura The Legend of Zelda: Breath of the Wild cotado para ser o melhor jogo do ano de 2017.
Mas, não é só a indústria japonesa que tem se sobressaído no universo dos jogos. Os sul-coreanos têm se destacado cada vez mais na produção de games que fazem a cabeça de jogadores em todo o mundo.
Após sucessos como Ragnarok (desenvolvido pela Gravity Corp) e GunBound (Softnyx), um novo game coreano está fazendo sucesso em todo o mundo e batendo diversos recordes. PlayerUnknown’s Battlegrounds (PUBG), desenvolvido pela Bluehole Studio, é o fenômeno do momento entre os gamers. “Ele já vendeu mais de 10 milhões de cópias. É o jogo mais popular do Steam [uma das maiores ferramentas de distribuição digital de jogos no mundo] e chegou a atingir um pico de 1.5 milhão de jogadores online na plataforma, quebrando o recorde de gamers simultâneos”, detalha Matheus.
O que vem por aí
Confira os principais jogos orientais que serão lançados nos próximos meses e já são aguardados com ansiedade por gamers de todo o mundo
Super Mario Odyssey
O eterno encanador de chapéu vermelho retorna aos holofotes em 27 de outubro com o lançamento de Super Mario Odyssey, seu game de estreia no Nintendo Switch. “Na sua nova aventura, Mario explora um mundo totalmente novo. Desde ruínas misteriosas a cidades cheias de arranha-céus”, descreve a Nintendo em seu site oficial. No novo game, o mascote da Nintendo conta com ajuda de um novo amigo, o Cappy – seu icônico chapéu vermelho. Com ele Mario pode coletar moedas, encarnar personagens e derrotar inimigos.
Cavaleiros do Zodíaco – Saint Seiya Online
Em uma mistura de lançamento oficial com fase de testes beta aberta, o MMORPG (multiplayer massivo de RPG) Cavaleiros do Zodíaco – Saint Seiya Online já está disponível para todos os jogadores. O novo game vai permitir que o jogador escolha entre oito classes de personagens e mais de 100 armaduras. O título é uma coprodução da Sega e Perfect World, e foi lançado no Brasil pela OnGame.
Final Fantasy XV Windows Edition
Criada por Hinorobu Sakaguchi e desenvolvida pela Square Enix, Final Fantasy XV Windows Edition tem estreia prevista para o início de 2018, e traz uma série de melhorias gráficas em relação a edição para consoles, lançada no final de 2016, após quase 10 anos de desenvolvimento. Com combates em tempo real, o game conta a história de Noctis, que embarca em uma busca com seus amigos fiéis para retomar sua terra natal.
Ni no Kuni II – Revemant Kingdom
O novo jogo da franquia de RPG da Level-5, Ni no Kuni II – Revenant Kingdom está previsto para ser lançado em janeiro de 2018, no PlayStation 4 e PC. Ao contrário do seu antecessor, o game não foi desenvolvido em parceria com o Studio Ghibli, mas conta com a presença de Yoshiyuki Momose, que trabalhou em animações do lendário estúdio. Além de novidades de combate, Revenant Kingdom vai trazer para a franquia um sistema de criação de reinos.
Dragon Ball Fighter Z
Cotado para ser a maior representação do animê/mangá de Akira Toriyama e um dos melhores games de luta dos últimos anos, Dragon Ball Fighter Z, da Arc System Works, tem previsão de lançamento no Brasil em fevereiro de 2018. O jogo traz batalhas entre trios, arte belíssima e muito similar ao animê e golpes fáceis de aprender.
Death Stranding
Cercado de mistérios, o novo jogo do desenvolvedor japonês Hideo Kojima, pela Kojima Productions para PlayStation 4, ainda não tem data de lançamento prevista, mas já é ansiosamente aguardado. De acordo com a descrição de seu criador, Death Stranding explorará novas ideias e conceitos: “Nós estamos prontos para um jogo que não é baseado em competição. Nós não precisamos separar as pessoas por vitória ou derrota, mas criar conexões em diferentes níveis”.
Os reis do eSports
Não basta criar os jogos mais importantes da história dos games e influenciar esse universo até hoje, os asiáticos ainda dominam o cenário competitivo de muitos jogos. São, literalmente, os reis do eSports, os esportes eletrônicos, que têm avançado nas últimas décadas e desde 2010 começou a se profissionalizar, impulsionado pela popularização mundial de League of Legends, o LoL, game de estratégia desenvolvido pela Riot Games.
A atividade envolve equipes profissionais, estádios cheios, transmissão ao vivo pela TV (e até em cinemas), com direito a narração no estilo futebolístico, salários similares aos de alto executivos, e cifras de dar inveja a muitos atletas. O The International 2017, campeonato mundial de Dota 2 – jogo similar ao LoL, desenvolvido pela Valve Corporation –, realizado no mês de agosto, ostenta a maior premiação dos eSports, com um total de aproximadamente US$ 25 milhões em prêmios distribuídos entre os participantes. Só a equipe campeã leva para casa a bagatela de US$ 10 milhões.
Assim como os esportistas de alto rendimento, os praticantes do eSports têm acompanhamento físico, psicológico e nutricional e treinamentos intensos. Na Coreia do Sul, alguns jogadores profissionais passam até 16 horas por dia treinando em uma “gaming house” – casa formada por uma organização de esportes eletrônicos, feita para que os jogadores morem e treinem seus respectivos games.
Com tanto foco e dedicação, não é de se estranhar que os asiáticos sejam considerados as lendas do eSports e dominem diversos títulos. “A Coreia do Sul domina há anos o LoL profissional, o Star Craft é praticamente um esporte nacional, sem falar que agora também estão arrebentando nos torneios de Overwatch, Heroes of the Storm e Tekken”, ressalta Matheus Zanetti. “A estrutura sul-coreana surpreende, eles têm um órgão do governo para os games profissionais, incentivos, altos investimentos de patrocinadores e até um estádio só para o eSports”, revela Lucas Silva.
Japão e China não ficam muito atrás. A terra do sol nascente tem os melhores competidores de Guilty Gear, Street Fighter e Tekken, todos games de luta. Já na China é possível encontrar alguns dos jogadores mais fortes do Warcraft 3 profissional e Cross Fire, além disso, o país é o “final boss” (adversário final) para muitos jogadores de Dota 2.
Já em terras brasileiras, o cenário competitivo ainda é muito modesto se comparado ao cenário asiático e americano. “O Brasil está começando, já temos equipes profissionais, campeonatos brasileiros de diversos jogos, times participando de torneios internacionais e no cenário profissional de Counter-Strike: Global Offensive (CS: GO) os brasileiros têm tido ótimos resultados, além das cenas de jogos menores”, explica Matheus.
Atualmente, o Brasil tem quatro equipes competindo nas ligas norte-americanas de CS: GO, inclusive a SK Gaming, liderada pelo paulista Gabriel “FalleN” Toledo, liderando o ranking mundial do game.
Outra equipe brasileira de destaque é a Pain Gaming, liderada pelo gaúcho Gabriel Bohm, o “Kami”, que é forte concorrente no Campeonato Brasileiro de League of Legends – CBLoL e já participou do campeonato mundial do game. Mas, em 2017 a tradição não ganhou o jogo, e a Pain caiu diante da estreante Team One na final do CBLoL, realizada no início de setembro, em Belo Horizonte.
Legendas:
Esports1: Estruturas de mega evento marcam os torneios de eSports
Esports2: Equipe sul coreana SK Telecom T1, tricampeã mundial de LoL
Brasil Game Show
Ponto de encontro dos fãs de games do Brasil e da América Latina, a capital paulista sedia, entre os dias 11 e 15 de outubro, no Expo Center Norte, a décima edição da Brasil Game Show – maior feira de games da América Latina e o segundo maior evento do setor no mundo em área utilizada, com público estimado em 300 mil pessoas.
Por lá, os gamers poderão encontrar mais de 250 marcas, convidados internacionais, jogos que sequer foram lançados e poderão ser testados, campeonatos entre times profissionais de esportes eletrônicos, uma maratona de desenvolvimento de jogos e uma área exclusiva de Meet & Greet para ver, pegar autógrafos e tirar fotos gratuitamente com personalidades do universo gamer.
Entre os convidados mais aguardados do evento está o diretor e designer de games japonês, Hideo Kojima, criador da série Metal Gear; Ed Boon, criador da série Mortal Kombat e Nolan Bushnell, criador do Atari 2600, que aterrissarão em São Paulo para participar de painéis sobre suas trajetórias profissionais, além de encontros com os fãs.
Para os que visitam a feira para conhecer os lançamentos de jogos, a organização já divulgou alguns títulos que farão parte dessa edição, destaque para Call of Duty: WWII e Destiny 2, da Activision; Assassin’s Creed Origins e South Park: A Fenda que Abunda Força, da Ubisoft; e Summoners War, da sul-coreana Com2Us, que este ano atingiu a marca de 80 milhões de downloads e é um dos games mais baixados na Apple Store e na Google Play.
A BSG reserva ainda um espaço especial dedicado ao mercado brasileiro e aos desenvolvedores independentes, a Área Indie, que contará com mais de 100 estandes, com diversos estúdios nacionais que apresentarão jogos dos mais variados temas. Estarão presentes, por exemplo, os premiados Distortions, da Among Giants e No Heroes here. Os desenvolvedores independentes participarão de palestras abertas para os visitantes da feira e contarão um pouco sobre sua carreira e trajetória profissional.
Para mais detalhes sobre a programação do evento e os ingressos restantes acesse o site oficial do evento: www.brasilgameshow.com.br.
Informações
Brasil Game Show
11 a 15 de outubro de 2017
Das 13h às 21h
Expo Center Norte (rua José Bernardo Pinto, 333 – Vila Guilherme)
facebook.com/BrasilGameShow
Instagram: @brasilgameshow