Ante o caos que tomou conta no setor político-administrativo do País, por conta do desvio sistemático e programado das verbas fixadas na Lei Orçamentária Anual aprovada pela sociedade, a população saiu às ruas no exercício legítimo da cidadania.
O Congresso Nacional reagiu rapidamente, não para sanar os males que afligem a nossa sociedade, mas para desviar o foco dos movimentos populares. Igualmente, as propostas de realização de plebiscito ou de referendo popular não passam de cortina de fumaça.
Rejeitou-se celeremente a PEC nº 37 que estava abundando, mas os mesmos parlamentares continuam dando guarida àqueles que foram empossados após a condenação sofrida perante o STF. Aprovou-se o projeto de Lei nº 41/2013, destinando para os setores da saúde e da educação os recursos provenientes dos royalties do petróleo, no percentual de 25% e de 75%, respectivamente, avançando nos recursos pertencentes aos Estados e Municípios. Agora, uma medida provisória espicha o curso de medicina de seis anos para oito anos, sem falar na importação de mil médicos cubanos. Por que não importar cozinheiros para acabar com a fome?
O Prefeito de São Paulo está reivindicando a utilização dos recursos da CIDE para subsidiar a tarifa de ônibus, o que importará em outro desvio de finalidade prevista na Constituição (art. 177, § 4º II, c), quando o certo seria retornar a prestação desse serviço público essencial ao regime constitucional, que não admite o sistema de capitalismo sem risco, em que o empresário do ônibus ganha a maior parte da remuneração na base do kilômetro rodado, com ou sem passageiro.
No fundo, a revolta popular tem raízes no descontrole da execução orçamentária, porque quando o Parlamento aprova o Orçamento Anual significa que a sociedade está aprovando em bloco todas as despesas fixadas nesse Orçamento, não se admitindo os desvios de recursos destinados à saúde, à educação, aos transportes coletivos, à segurança pública etc. Em artigo publicado no O Estado, dia 2-7-2013, p. A6 Dora Kramer afirma que apenas 39,3% dos R$ 50,6 bilhões orçados foram gastos na área de saúde; dos R$ 53,3 bilhões disponíveis para a área de educação apenas 61,3% foram aplicados; para o setor de transportes dos R$ 118,5 bilhões disponíveis apenas 60,5% foram utilizados. Pergunta-se, onde foram parar as diferenças faltantes? Ninguém sabe, e nem se descobre!
Cabe ao Congresso Nacional cumprir e fazer cumprir os dispositivos constitucionais e legais em vigor, fiscalizando e controlando a execução orçamentária. Quanto maior o descontrole das despesas públicas, maior será o peso da carga tributária, e quanto maior a carga tributária, mais depressa desaparecerão os recursos arrecadados pelos ralos que continuam em aberto. É preciso reverter essa perversa cultura de que o Orçamento Anual é peça de ficção. Ele é, na verdade, um instrumento eficaz do exercício da cidadania.
A reivindicação popular diz respeito à reforma do político e não à reforma política. Por isso, o pretendido plebiscito é mais um desperdício de recursos públicos que a população tanto condena. Descobrir o melhor meio de governar é responsabilidade do governante. Quem não tem um bom plano de governo, por ignorar a realidade do País, nem deveria ser candidato.
A única resposta correta às manifestações populares a ser dada é a de enxugar a máquina administrativa, gastar mais nas despesas de investimentos e menos nas despesas com a folha, enfim, fazer com que as receitas públicas se destinem exclusivamente para o cumprimento dos fins do Estado que, em última análise, resume-se na realização do bem comum. Para tanto é preciso que o Orçamento Anual seja fielmente executado tal como aprovado pela sociedade pagante.
KIYOSHI HARADA é jurista, acadêmico e Presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social.