Opinião: A violência e a ditadura da televisão

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Nos anos 60 do século passado, portanto cerca de 50 anos atrás, uma campanha publicitária, provavelmente oficial, alertava dos perigos de uma mídia muito forte na época, entre crianças e jovens. Esta mídia era representada pelas revistas em quadrinhos, popularmente conhecidas como gibis (Fantasma, Mandrake, Zorro, Cavaleiro Negro e outros), com historinhas nas quais os mocinhos combatiam e venciam os bandidos…

Nelson FukaiCartazes colados em estabelecimentos comerciais diziam: “hoje mocinho, amanhã bandido”, um alerta que as autoridades faziam, com receio que as crianças e jovens, naturalmente simpáticos aos mocinhos, acabassem sendo influenciados e se tornassem adultos que usariam a violência das armas para resolver questões pessoais, tornando-se bandidos na vida real. Claro que foi um exagero e as poucas crianças da época que se tornaram bandidos, com certeza não foram pela influência dos gibis. Primeiro porque com o alto índice de analfabetismo infantil que assolava o país e a miséria que vivia grande parcela da população, os gibis eram acessíveis apenas para poucos, que, por serem de famílias bem estruturadas, eram menos influenciáveis.

Mas algumas décadas depois, uma mídia muito mais poderosa tomou conta do país. No início era privilégio das grandes capitais e da população mais rica. Os programas eram educativos e recreativos sem apelações. Mesmo os humorísticos, nos momentos mais sórdidos, eram, no máximo, picantes. Com o tempo – e porque era interessante para os poderosos -, a televisão atingiu todas as classes sociais. Principalmente nas camadas mais humildes, passou a ser o grande, senão o único, veículo de lazer e de transmissão de informações.

Por uma série de fatores (econômicos, comodidade, etc), os pais foram sendo substituídos pela televisão na formação de milhões de crianças, principalmente a partir dos anos 80/90 do século passado. Com claro objetivo comercial, a televisão brasileira optou pela degradação dos valores morais e pela apologia ao consumismo. O primeiro, para assegurar maior audiência (objetivando preços maiores para os comerciais); o segundo, para vender mais os produtos anunciados. Para desgraça da nação, esse esquema vem tendo sucesso total, criando grandes problemas para o país e isso não só nas classes mais humildes, mas em brasileiros mais abastados financeiramente, porém, menos preparados culturalmente e mais influenciáveis. Não demorou muito e a educação, a civilidade, os bons modos passaram a ser artigo em falta no cotidiano brasileiro. O aumento de alimentos pobres em vitaminas e ricos em porcarias aumentou assustadoramente, resultando numa população de obesos de todas as idades. É bastante provável que as próximas gerações venham a morrer com menos idade do que os idosos de hoje, revertendo uma tendência que vem se mantendo nas últimas décadas. Esses dois problemas são graves, mas individualmente existem formas de evitar que tragam grandes dissabores. Todavia, o grande mal causado pela influência da televisão, principalmente nas pessoas com famílias desestruturadas, foi o aumento da violência. E este é um mal do qual não temos como fugir, estamos todos expostos e com consequências gravíssimas. A coisificação trazida pela onda de consumismo, deixando a vida humana com valor secundário e a degradação dos valores morais, acabando com o freio que segura os instintos humanos mais baixos, tornou banais os crimes de morte.

Todos clamam pela diminuição da violência, com mais polícia e leis rigorosas. A longo prazo, talvez, isso nem fosse necessário. O que é preciso, mesmo, é diminuir a fábrica de bandidos. Porque estamos secando gelo. Quanto mais bandidos são mortos e presos, mais aparecem para ocupar seus lugares. Isso sem contar a violência dos não bandidos, pessoas comuns que resolvem os problemas do cotidiano na base da bala (crimes no trânsito, crimes passionais, etc). Precisamos tirar a maldade do coração das pessoas. E isso só se faz com amor, com a valorização dos princípios morais e com a diminuição da onda consumista. Todos, bandidos ou não, são resultado da desestruturação da família e da influência negativa da mídia. Ou começamos a estruturar novamente o ambiente familiar e a valorizar os bons princípios morais e éticos, ou vamos deixar que os absurdos dos programas e novelas da tv continuem a educar nossas crianças, fabricando milhões de novos bandidos.

Audiência zero para novelas, BBBs, Pânicos e outros mostrengos. Disciplina na escola e muito amor e carinho em casa. É isso ou vamos continuar a viver amedrontados e a chorar pelas vítimas da violência!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br